O Globo
Comissionados
são 40% da administração direta em Niterói
Dados do IBGE mostram que Niterói tem
maior percentual entre grandes cidades
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POR IGOR MELLO
24/04/2016 6:00
Niterói tem maior percentual de
comissionados entre grandes cidades - Editoria de Arte
NITERÓI -
Dados do IBGE mostram que Niterói é o município do estado do Rio com maior
percentual de comissionados — os cargos de confiança — na administração direta:
são 1.458 nomeados, 40% dos 3.643 empregados neste setor da prefeitura. A
cidade também lidera o ranking entre os municípios brasileiros com mais de 500
mil habitantes.
As
informações fazem parte da base de dados da publicação “Perfil dos municípios
2015”, divulgada no último dia 15, que recolheu informações sobre o
funcionalismo municipal no Brasil entre agosto e novembro do ano passado. O
estudo considera apenas os comissionados que não têm qualquer outro vínculo com
as prefeituras, excluindo da conta, por exemplo, servidores públicos que
acumulam cargos de confiança.
Os números
de Niterói contrastam com o padrão do país: segundo o documento, nos municípios
brasileiros, em média, apenas 8,3% da força de trabalho das prefeituras é
composta por comissionados. O percentual é ainda menor nos municípios com mais
de 500 mil habitantes, caindo para 5,3%.
Pelo Portal
da Transparência municipal, o pagamento dos comissionados em março custou aos
cofres públicos mais de R$ 3,4 milhões, cerca de 26% dos gastos com a folha de
pagamento no mês.
LEI NÃO
LIMITA QUANTIDADE DE CARGOS
O recorte da
pesquisa do IBGE se refere, exclusivamente, aos nomeados na administração
direta. Em Niterói, esse setor concentra 40 órgãos, entre gabinete do prefeito,
vice-prefeitura, secretarias e administrações regionais. O município argumenta
que boa parte dos servidores efetivos (concursados) está na administração
indireta, em que se encaixam fundações, autarquias e empresas públicas, a
exemplo das fundações municipais de Educação, Saúde e Arte e da Clin.
A prefeitura
ressalta ainda, em nota, que o número de comissionados não aumentou nos últimos
anos: “A nova gestão da prefeitura, ao assumir em 2013, promoveu várias medidas
de austeridade e não deu provimento a cerca de 60% dos cargos de confiança
existentes. Ao longo dos últimos dois anos foi necessário recompor o quadro de
direção e coordenação de unidades de saúde, de escolas e de administrações
regionais para a retomada dos investimentos e conservação da cidade. A nova
gestão da prefeitura não aumentou o número de comissionados e pretende
mantê-los em quantidade inferior aos existentes na administração anterior”.
De acordo
com Paulo Corval, professor de Direito Tributário e Financeiro da UFF, a
admissão de comissionados, quando feita com critério, não é negativa.
Entretanto, ele crê que houve uma opção da atual gestão por preencher vagas
desta forma, já que esse grupo não tem estabilidade, diferentemente dos
concursados.
— Essa pode
ser uma forma de suprir vagas sem onerar a previdência. Os comissionados podem
ser desligados sem ônus para o município, algo que não ocorre nem com
empregados da iniciativa privada, contratados através do regime da CLT.
Entretanto, isso acaba com a concorrência para o ingresso no serviço público,
já que os comissionados não fazem concurso. Pelo número, isso é uma estratégia
de gestão.
Corval
destaca, porém, que o alto percentual mostra um “claro desvio da finalidade dos
cargos comissionados”.
— Eles (os
cargos) existem para que (com a troca de governo) os gestores possam renovar os
“cabeças” da administração — explica o especialista, referindo-se aos cargos de
confiança.
O advogado
Ulysses Monteiro, conselheiro da OAB Niterói e especialista em administração
pública, esclarece que a lei não define limites de cargos em comissão, dando
margem para gestores nomearem livremente pessoas para a máquina:
— Não há
qualquer preceito legal que limite a quantidade de comissionados. Contudo, esse
é um número muito alto para a administração direta, que concentra os principais
serviços e funções da prefeitura.
Comandadas
por integrantes do núcleo duro da gestão de Rodrigo Neves, as secretarias
Executiva e de Governo são as que mais dispõem de cargos comissionados. São,
respectivamente, 322 e 196. Já as 14 administrações regionais, que abrigam
indicados de vereadores da base do governo, somam outras 168 nomeações. O
cenário pouco mudou em relação ao governo anterior: o ex-prefeito Jorge Roberto
Silveira (PDT) encerrou seu mandato, em 2012, com 1.547 comissionados na
administração direta, que representavam 40,4% dos trabalhadores. Em seus
primeiros dias de governo, o prefeito Rodrigo Neves anunciou um corte de 1.100
cargos. No entanto, como O GLOBO-Niterói mostrou em setembro de 2015, todos
eles foram reativados ao longo de seu mandato.
A quantidade
de comissionados na gestão anterior foi alvo de fortes críticas da equipe de
Rodrigo Neves ainda durante o processo de transição. Em dezembro de 2012, duas
semanas antes de o prefeito assumir, Patricia Audi, que comandou a Secretaria
de Planejamento até fevereiro de 2015, mostrou-se surpresa com o número de
nomeações. Segundo ela, os nomeados atuavam inclusive em serviços essenciais à
população.
— Analisando
tecnicamente, encontramos números impressionantes, que não condizem com uma
prefeitura que tem 500 mil habitantes. Sabemos que a despesa com comissionados
mais do que dobrou, mas desconhecemos os motivos, o que fazem e onde estão
esses funcionários. Não posso fazer juízo de valor e dizer se é certo ou
errado, mas pergunto: por que não pensaram em fazer concursos? — criticou a
secretária na ocasião, manifestando o desejo de reduzir o número de nomeações e
dar mais eficiência à máquina pública.